5 diretrizes para o presente e o futuro dos bancos de desenvolvimento
Muito se discute sobre o que é um banco de desenvolvimento e qual deveria ser o papel de uma instituição desse tipo. A partir dos relatos e apresentações sobre a atuação de 9 destas entidades, em seminário realizado no BNDES, foi possível encontrar desafios comuns, que ajudam a (re)definir o papel dos bancos e agências de fomento ao desenvolvimento na atualidade e no futuro próximo. A seguir, listamos 5 diretrizes que vem sendo adotadas pelos BDs como resposta a esses desafios.
1) Atuação dos bancos de desenvolvimento em cenários de escassez ou restrição de recursos públicos
Para lidar com limitações orçamentárias a que os governos estão sujeitos regularmente, sobretudo em momentos de crise e de restrição fiscal, é fundamental que as instituições de desenvolvimento reforcem suas posições na captação de recursos, por meio de outras fontes, como o mercado de capitais e investidores institucionais, seja local ou internacionalmente.
A estratégia adotada pela entidade colombiana Financiera de Desarollo Nacional (FDN) desde sua criação, já apontava nessa direção.“Decidimos que teríamos que criar uma nova institucionalidade, que nos permitisse liderar a mobilização dos recursos”, declarou o presidente da instituição colombiana, Clemente del Valle.
O representante do Banco de Desenvolvimento da África do Sul (DBSA), Paul Currie, e a diretora do Banco Mundial, Ceyla Pazarbasioglu, reforçaram o papel estratégico dos BDs na atração de investimentos privados. No entanto, há dificuldades em envolver os agentes privados em projetos de longo prazo, que, via de regra, oferecem maiores riscos para os investidores, como relatou o diretor do KfW Banco de Desenvolvimento, Wolfgang Reuβ.
No caso específico do Brasil, a superintendente do BNDES Luciene Machado reforça que o estímulo a uma participação maior da iniciativa privada no financiamento de projetos de interesse público é necessário, já que os aportes do BNDES não são suficientes para suprir a demanda do país.
2) Apoio especial para micro, pequenas e médias empresas (MPMEs)
O investimento cada vez maior no desenvolvimento de micro, pequenas e médias empresas configura-se em eixo estratégico de atuação para todos os BDs. O suporte a essas empresas, que, em geral, encontram dificuldades na aquisição de crédito, potencializa a atividade econômica, o desenvolvimento de mercados, o empreendedorismo, a inovação e a geração de empregos nesses países.
Wolfgang citou o impacto das tecnologias digitais sobre a atuação do banco alemão, propiciando maior agilidade nas operações e a aproximação da instituição das pequenas e médias empresas, com consequente ampliação do acesso ao crédito, por permitirem a utilização de novos canais de relacionamento.
Esse tipo de aproximação também foi relatada por Mario de la Vega, diretor da Nacional Financiera do México. A Nafin criou uma plataforma digital com o objetivo de faciliar o acesso ao crédito, o que, para ele, transformou a instituição em uma espécie de fintech, nomenclatura utilizada para designar empresas do setor financeiro cujo modelo de negócios é pautado no uso intensivo de tecnologia e inovação.
3) Adoção de indicadores de desempenho mais alinhados aos objetivos dos BDs
O DBSA recentemente mudou a métrica de desempenho adotada para avaliar os resultados da atuação do banco, deixando de medir a performance segundo o volume de recursos desembolsados e passando a considerar principalmente o montante de recursos alavancados no setor privado. Essa iniciativa foi elogiada por Eva Gutierrez, do Banco Mundial, para quem “metas muito agressivas de desembolsos acabam gerando ‘crowding-out’ no setor privado”, efeito oposto à mobilização desejada pelos BDs.
Sobre as métricas de desempenho tradicionalmente adotadas pelas instituições de financiamento públicas, como o volume de desembolsos ou o tamanho da carteira de crédito, Edgardo Chávez, secretário geral da Alide, Associação Latinoamericana de Instituições Financeiras para o Desenvolvimento, reconhece que são formas de medir o desempenho, mas relativiza sua importância, já que não indicam aquilo que, de fato, os bancos de desenvolvimento deveriam medir, sua “capacidade de ajudar os mais necessitados e melhorar suas condições de vida”.
Também pensando para além dos indicadores financeiros, Luis Felipe Oliva, da agência de fomento do governo chileno – Corfo –, destacou a importância de se levar em conta o impacto da atuação do banco sobre a realidade abordada. Para ele, é fundamental registrar o que teria acontecido caso o projeto em questão não fosse executado, uma avaliação quase sempre negligenciada pelas instituições.
4) Investimentos em projetos de Educação como vetor de desenvolvimento econômico
Ainda que cada instituição tenha direcionamentos específicos, conforme as particularidades do país ou região em que atua, é cada vez mais clara a compreensão de que a área de Educação é um motor essencial na rota do desenvolvimento. É preciso formar profissionais que sejam capazes de atuar em todos os setores, garantindo a produtividade da economia, seja ao diminuir déficits de mão de obra históricos, seja ao ocupar vagas que se abrirão no futuro, alinhadas às estratégias de desenvolvimento.
Praticamente todas as instituições relataram inciativas nesse sentido, como programas de crédito universitário, de infraestrutura escolar, além de projetos voltados para a capacitação profissional.
A Nafin desenvolveu cursos on-line gratuitos que oferecem às pequenas e médias empresas a oportunidade de adquirir habilidades e conhecimentos para o desenvolvimento do negócio, a fim de consolidar uma cultura corporativa no país e promover uma maior profissionalização desses empreendedores.
Atuando em toda a América Latina e Caribe, a Alide oferece programas de treinamento dedicados à prática do desenvolvimento e promove o intercâmbio de informações com outras instituições, prática adotada também pelo China Development Bank, segundo seu representante, Song Lei, que destacou a cooperação regional do CDB com outros dez bancos do sudeste asiático.
5) Estruturação e modelagem de projetos adequados aos empreendimentos
Relacionada diretamente à questão de captação de recursos, a modelagem de projetos vem ganhando papel cada vez mais estratégico nas instituições de fomento. Há duas perspectivas que precisam ser levadas em conta na elaboração dos projetos de investimento: por um lado, o objetivo de gerar impactos positivos para sociedade; por outro, a necessidade de minorar riscos para os investidores.
Diante dessa realidade, torna-se fundamental uma modelagem adequada, que gere projetos atraentes para o mercado (captação de recursos) e, ao mesmo tempo, seja capaz de entregar os resultados esperados, sob o ponto de vista do desenvolvimento, contribuindo para objetivos sociais, econômicos, culturais e ambientais.
Para Paul Currie, a maior dificuldade está justamente em “prepará-los (os projetos) para o financiamento pelo mercado, de forma a mitigar os riscos”. Em razão da imprevisibilidade e do tempo de maturação (e retorno) desses projetos, os riscos costumam ser significativamente maiores que aqueles observados para outros tipos de investimento. Esse é um dos principais entraves a uma maior participação do setor privado nos financiamentos a projetos de longo prazo.
“O ator privado que vai investir precisa ter previsibilidade de regras, conhecer o edital com antecedência e trabalhar com uma modelagem que lhe ofereça o retorno esperado”, contextualizou Luciene Machado. O BNDES e outras instituições têm dado maior ênfase à estruturação e preparação de projetos há algum tempo, agregando maior credibilidade a esses empreendimentos e atuando como “sinalizadores” para o mercado, facilitando a atração de recursos privados.
Paralelamente à preocupação de viabilidade financeira, é essencial que os projetos apoiados gerem externalidades positivas para toda a sociedade, trazendo melhorias tangíveis para a população do país (ou região), sejam em termos de crescimento econômico ou no tocante a inclusão social e sustentabilidade ambiental.
Não se pode perder de vista a essência dos bancos de desenvolvimento. Projetos ligados a áreas fundamentais como saúde, saneamento, educação e transportes têm a capacidade de produzir impactos positivos para a população das áreas abrangidas por esses projetos, desde que elaborados de forma estratégica e ancorados na realidade.
Mesmo economias desenvolvidas precisam de instituições que atuem para suprir demandas não atendidas adequadamente pela iniciativa privada, as chamadas falhas de mercado. O representante do banco alemão citou a atuação do KfW no financiamento habitacional, com destaque para aspectos de sustentabilidade das operações.
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