Novo papel das estatais
Configuração institucional do Estado brasileiro precisa ser reavaliada
MARCELO DE SIQUEIRA FREITAS E MAURILIO GUIGNONI*
Aguardada por quase duas décadas (desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 19/1998), a Lei 13.303, de 30 de junho de 2016, também conhecida como a Lei das Estatais, entregou-nos o “estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias”.
A lei, dentre outros objetivos, buscou responder aos anseios da sociedade pelo aprimoramento dos modelos de gestão da coisa pública, tendo como eixos fundamentais transparência, ética, eficiência e controles efetivos. Nesse sentido, ela visa a promover o fortalecimento do papel dos órgãos estatutários das empresas; tornar mais rígidos os requisitos profissionais/pessoais e as responsabilidades dos seus administradores; e disciplinar as relações com os entes políticos que as controlam.
O novo diploma legal chega num momento em que a configuração institucional do Estado brasileiro precisa ser reavaliada, exigindo uma profunda e geral reflexão sobre “por quê”, “quando”, “como” e “onde” o Estado e suas empresas estatais devem atuar.
A Lei das Estatais é, portanto, uma excelente “janela de oportunidade forçada” para que os gestores públicos reflitam sobre essas questões e promovam o necessário realinhamento dos objetivos das companhias com os interesses coletivos que inspiraram sua criação — ou mesmo ressignifiquem tais interesses à luz das contingências econômicas vigentes e da função social que elas visam a exercer. Ela também abre caminho para uma revisão e modernização do conjunto de ferramentas de gestão e governança das estatais, permitindo que se adotem padrões mais eficientes, competitivos e sustentáveis de atuação.
Sensível a isso, o BNDES se antecipou e foi a primeira empresa estatal federal a adequar integralmente seu estatuto social à nova legislação, realizando sua mais profunda reforma estatutária/societária em, pelo menos, 15 anos.
O trabalho de elaboração do novo Estatuto Social do BNDES revelou-se um espaço de intensas reflexões com equipes e profissionais de diversas áreas (economia, finanças, contabilidade, direito, administração e tecnologia da informação). Como resultado, além do pioneirismo na adaptação decorrente da Lei das Estatais, o banco conta hoje com uma nova roupagem institucional, mais alinhada às atuais práticas e técnicas do mercado em que atua (bancário) e apropriada para enfrentar os desafios corporativo-estratégicos postos.
No caso do BNDES, que tem como missão histórica promover o desenvolvimento sustentável da economia brasileira, a edição de um novo estatuto social significa não apenas uma medida de conformação à legislação vigente, mas também uma tentativa de comunicar aos diversos parceiros da instituição (governo federal, clientes, investidores, sistema financeiro e, principalmente, cidadãos) seu compromisso permanente com a melhoria dos padrões de eficiência, transparência e controle, bem como sua disposição para estabelecer relações pautadas na confiança, previsibilidade e cooperação.
(*) Marcelo de Siqueira Freitas é diretor jurídico, e Maurilio Guignoni é advogado do BNDES
Publicado originalmente no jornal O Globo no dia 3 de abril de 2017